O compromisso com a biodiversidade nas obras do Campus Arandu

Pedro Teles durante entrevista no Refúgio Biológico Bela Vista. Foto: Fernanda Yumi/UNOPS

“Cuidado ao visitar as instalações da obra da UNILA, dizem que lá tem onça”. Com certeza você ou alguém que você conhece já ouviu essa frase por aí. Essa história surgiu logo após a obra do Campus Arandu ser paralisada, em 2014, e foi ganhando força ao longo dos anos, sendo repetida até os dias de hoje. 

E o que de início pode parecer um mito, não é tão mito assim. Mas longe de representar um risco ou um empecilho para a retomada das obras, a presença de animais chama a atenção para um tema muito importante: a preservação ambiental na região e a coexistência entre humanos e a biodiversidade.  

No Refúgio Biológico Bela Vista, da ITAIPU Binacional, especialistas monitoram de perto essa dinâmica e a movimentação dos animais. Um deles é o médico veterinário Pedro Teles, da Divisão de Áreas Protegidas da ITAIPU, que vem acompanhando as atividades do projeto de finalização das obras do Campus Arandu para garantir que a fauna e flora locais sejam preservadas. Em entrevista, ele conta mais sobre como este projeto pode ser um modelo para iniciativas que buscam harmonizar desenvolvimento e conservação. Confira:

Com a retomada das obras do Campus Arandu, qual trabalho precisa ser feito para continuar com a preservação da biodiversidade na região?

Durante e depois da finalização das obras, vai ocorrer uma grande intervenção humana na região, e aqui a gente vai ser exemplar. Vamos mostrar que é possível ter uma obra dessa magnitude, que vai receber uma grande quantidade de estudantes e pesquisadores, e ao mesmo tempo permitir que essa fauna continue circulando no entorno, fazendo o seu papel ambiental. Vamos fazer um acompanhamento dos animais que utilizam aquela área e propor um desvio gradual desse trânsito para uma área mais segura para eles e para as pessoas. 

É importante que seja feito o monitoramento contínuo daquela área com armadilhas fotográficas (câmeras espiãs instaladas no meio do mato) e rádio colar, para ver como eles se movimentam e seus hábitos. A obra da UNILA é a oportunidade de mostrar que a coexistência é possível, assim como é possível ter uma universidade de ponta e uma obra enorme em um espaço com fauna no entorno, árvores em volta, sombra para as pessoas, carbono apreendido, qualidade de água, tudo isso dentro do mesmo espaço. É isso o que a gente quer: servir de exemplo para todas as grandes obras de infraestrutura.

E, afinal, tem onça ou não na região das obras do novo campus da UNILA?

Pedro Teles: O trabalho de restauração ambiental da usina de ITAIPU trouxe para a região uma série de animais, entre eles a onça. Como a área das obras da UNILA ficou por muito tempo vazia,  as onças, assim como outros animais a exemplo de capivaras, veados, quatis e macacos, acabaram utilizando aquela área para trânsito. Então, sim, tem onça naquela região.

Em relação à segurança das pessoas. Os animais presentes na região conferem algum perigo, principalmente para quem estará no canteiro de obras?

A onça é um animal que mexe muito com a imaginação das pessoas, mas, na verdade, a gente já tem onças circulando por Foz do Iguaçu. Tem onças no Parque Nacional do Iguaçu, na área de ITAIPU, e nem por isso a gente teve um acidente. Nunca foi registrado incidente na região. Então é possível conviver sem se expor ao risco. Desde que as pessoas continuem utilizando aquela área para o trabalho, e os animais continuem utilizando a floresta para se alimentar, esse risco é muito baixo.. 

Se a gente respeita os animais, os animais respeitam a gente. É nisso que a gente acredita, que trabalhando no planejamento para remanejar e direcionar essa fauna em torno dessa área, a gente praticamente zera qualquer risco.

E qual a importância de fazer um planejamento prévio de remanejamento desses animais? 

Infelizmente a gente não consegue sentar com os animais em uma sala de aula e explicar que a partir de agora eles não podem mais utilizar essa ou aquela área para circular. Eles precisam de um tempo para se adaptar à nova realidade, e uma obra é uma coisa que chega quase de uma vez com máquinas e trabalhadores. 

Assim, o planejamento é importante para que a gente possa fazer isso de forma gradual e a fauna vá entendendo e passando a utilizar novas rotas de trânsito, novos lugares de ocupação. Nesse sentido, a gente já faz pequenas intervenções que já vão deslocando esses animais para um lugar mais seguro, ao invés de fazer logo uma grande intervenção e correr o risco do animal entrar no canteiro de obra. 

Equipe de especialistas da UNILA, UNOPS e do Refúgio Biológico da ITAIPU durante agenda sobre a pauta ambiental na retomada das obras. Foto: UNOPS

Tem mais alguma coisa que você gostaria de dizer para quem está acompanhando a retomada do projeto? 

Uma das mensagens é que para a gente fazer uma estrutura sustentável, ela tem que ser pensada a partir da sustentabilidade como um todo, incluindo o seu entorno, porque é isso que vai manter o clima bom, o solo bom naquele local, e vai fazer com que aquele local seja agradável, tanto pros animais quanto pras pessoas por muitos e muitos anos. 

É muito importante a gente entender que é possível fazer grandes estruturas que atendam às demandas humanas, mas essas grandes estruturas também precisam atender à grande demanda da biodiversidade. É possível a fauna, as pessoas, as obras, as onças e as árvores existirem no mesmo lugar, e é isso que a gente vai fazer o possível para alcançar.

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